sexta-feira, 28 de junho de 2013

Elogio da Amada (Ruy Belo)

"Ei-la que vem ubérrima numerosa escolhida
secreta cheia de pensamentos isenta de cuidados
Vem sentada na nova primavera
cercada de sorrisos no regaço lírios
olhos feitos de sombra de vento e de momento
alheia a estes dias que eu nunca consigo
Morde-lhe o tempo na face as raízes do riso
começa para além dela a ser longe
A amada é bem a infância que vem ter comigo
Há pássaros antigos nos límpidos caminhos
e mortes como antes nunca mais
Ei-la já que se estende ampla como uma pátria
no limiar da nossa indiferença
Os nossos átrios são para os seus pés solitários
Já todos nós esquecemos a casa dos pais
ela enche de dias as nossas mãos vazias
A dor é nela até que deus começa
eu bem lhe sinto o calcanhar do amor
Que importa sermos de uma só manhã e não haver  em volta
árvore mais açoitada pelos diversos ventos?
Que importa partirmos num desmoronar de poentes?
Mais triste mesmo a vida onde outros passarão
multiplicando-lhe a ausência que importa
se onde pomos os pés é primavera?" Ruy Belo, in "Aquele Grande Rio Eufrates"





B.

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Momentos

Confesso que o que me apetecia mesmo, mesmo, mas mesmo agora, era estar ao lado da cara-metade, partilhar mesa em boa companhia e para completar o quadro, com umas frescas, tremoços, queijo e massa malagueta.
Mham mham!
Bom, já agora, algures no paraíso...






B.

domingo, 23 de junho de 2013

Para desenterrar o grande cepo do poema e voltar a enterrá-lo (Miguel-Manso)

"Aquele que caminha de um lugar que não sabe
a um lugar que não pode, meteu agora pela travessa dos arcanos
das difíceis coisas mínimas que enxameiam sob a terra
e por cima dos joelhos
mudará de arredores com a leve motricidade vocabular
até lhe arderem todos os aspectos, as visões
e o prodígio se transforme em préstimo elucidário de nenhuma
sabemos já, alegria ou valimento
está certo: um erro em muitos erros deixará o ledor (quem é?)
boquiaberto
provado parentesco o nosso
na verdejante paisagem do exuberar mental: um escreve escuro
montanhoso; o outro repara, se repara, nesse nexo
solitário e da linhagem de Anthero
pouco chic, hoje, este infortúnio dos versos
o diabo
da ideia, sinuosamente entrecortado de proveitos poucos
onde a mais teclada carne não é mais que o corpo
velho chamado Humanidade
por ora, todavia, o destapar dos detalhes não supera
a rotativa duração que nos transporta, nem esta monografia
conversa com a grandíloqua divindade, conserva
o gesto que se dirige ao gigantesco assunto de que nunca
ouviremos falar
vou dizer-vos
eu estava em deslocação pela noite do metro, olhando
o meu reflexo no vidro, atravessando aquele medo
havia, por cima e em volta, essa mesma claridade que nos engana
quotidianamente
então eu via o meu reflexo, parado, e para lá do meu parado
reflexo passavam num relâmpago sucessivo e baço
as paredes do sentido (o túnel) riscadas de coloridas tubagens
ora
eu estava parado dentro do movimento vasto do engano
lembrei-me de sonhar que podia ser tudo aquilo verdade
a associada circunstância de eu estar morto, de eu estar vivo
de ser esse o exacto, irresoluto, lugar da poesia" Miguel-Manso



B.

I'm Waiting Here...



B.

terça-feira, 18 de junho de 2013

L o n g e

...hummmm...

longínquas paragens essas...
distâncias imensas...
saudades enormes...

"Algum dia, talvez dentro de pouco tempo, construirei um barco muito grande; que possa flutuar como os barcos e voar como os aviões, apesar de ser um barco; que possa circular sobre a terra e por baixo de água como um barco com rodas, como uma nave submarina." in A grande viagem de Anna Castagnoli & Gabriel Pacheco

Para que consiga rapidamente raptar-te e ficar ao teu lado, simplesmente.




B.

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Algumas proposições com pássaros e árvores (Ruy Belo)


 “Os pássaros nascem na ponta das árvores
As árvores que eu vejo em vez de fruto dão pássaros
Os pássaros são o fruto mais vivo das árvores
Os pássaros começam onde as árvores acabam
Os pássaros fazem cantar as árvores
Ao chegar aos pássaros as árvores engrossam movimentam-se
deixam o reino vegetal para passar a pertencer ao reino animal
Como pássaros poisam as folhas na terra
quando o outono desce veladamente sobre os campos
Gostaria de dizer que os pássaros emanam das árvores
mas deixo essa forma de dizer ao romancista
é complicada e não se dá bem na poesia
não foi ainda isolada da filosofia
Eu amo as árvores principalmente as que dão pássaros
Quem é que lá os pendura nos ramos?
De quem é a mão a inúmera mão?
Eu passo e muda-se-me o coração” Ruy Belo








B.

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Metafísica (Fiama Hasse Pais Brandão)

"Todas as árvores apaziguam
o espírito. Debaixo do pinheiro bravo
a sombra torna metafísica
a silhueta de tronco e copa.
Em volta da ameixoeira temporã
vespas ensinam aos meus ouvidos
louvores. As oliveiras não se movem
mas as formas da essência desenham-se
cada dia com o vento.
Na sombra os frémitos
acalentam o pensamento
até ao não pensar. Depois
até sentir a vacuidade
no halo das flores que o envolve.
Sob as oliveiras, por fim,
que não se movem contorcendo-se,

concebe o não conceber" Fiama Hasse Pais Brandão




B.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Sem Ti (Eugénio de Andrade)

"E de súbito desaba o silêncio.
É um silêncio sem ti,
sem álamos,
sem luas.
Só nas minhas mãos
oiço a música das tuas." Eugénio de Andrade, Coração do dia






B.

sexta-feira, 7 de junho de 2013

terça-feira, 4 de junho de 2013

Há factos nem sempre (Ir)reais...

"Ser amigo é…
Sentirmo-nos iguais ainda que sejamos diferentes.
Não darmos importância à nossa aparência.
Apoiarmo-nos nos tempos difíceis..." Arianna Papini in Ser Amigo (Editora Kalandraka)



Enfim, talvez um dia perceba (alg)uns comportamentos ou (ab)usos.
Amor, ajuda-me a ver a cena com os outros olhos, porque de facto, há factos que jamais deveriam ser reais. Apesar da minha (gigante e galáctica) paciência, julgo que esta cena e decisão egoísta a roçar uma "artistete" do Sr. A. me vai provocar uma tempestade de palavras! Estou tentada, confesso.
No entanto, temos sempre que ver o lado positivo deste tipo de comportamentos, acabei de ter 2 ideias para um novo projecto.
Enfim, ainda bem que há factos que passam a reais e me fazem esquecer certos Sr.s.
Enfim... Já agora deixo-te amor e deixo-vos uma colecção de flores para colorir/perfumar a noite!
Ana Ventura

Ana Ventura

Klimt















B.


sábado, 1 de junho de 2013

Tríptico (Herberto Helder)

"Não sei como dizer-te que minha voz te procura
e a atenção começa a florir, quando sucede a noite
esplêndida e vasta.
Não sei o que dizer, quando longamente teus pulsos
se enchem de um brilho precioso
e estremeces como um pensamento chegado. Quando,
iniciado o campo, o centeio imaturo ondula tocado
pelo pressentir de um tempo distante,
e na terra crescida os homens entoam a vindima
— eu não sei como dizer-te que cem ideias,
dentro de mim, te procuram.
 Quando as folhas da melancolia arrefecem com astros
ao lado do espaço
e o coração é uma semente inventada
em seu escuro fundo e em seu turbilhão de um dia,
tu arrebatas os caminhos da minha solidão
como se toda a casa ardesse pousada na noite.
— E então não sei o que dizer
junto à taça de pedra do teu tão jovem silêncio.
Quando as crianças acordam nas luas espantadas
que às vezes se despenham no meio do tempo
— não sei como dizer-te que a pureza,
dentro de mim, te procura.
 Durante a primavera inteira aprendo
os trevos, a água sobrenatural, o leve e abstracto
correr do espaço —
e penso que vou dizer algo cheio de razão,
mas quando a sombra cai da curva sôfrega
dos meus lábios, sinto que me faltam
um girassol, uma pedra, uma ave — qualquer
coisa extraordinária.
Porque não sei como dizer-te sem milagres
que dentro de mim é o sol, o fruto,
a criança, a água, o deus, o leite, a mãe,
o amor,

que te procuram." Herberto Helder


B.